E o Morro das Contas?

Um observatório, no seu sentido comum, deve ficar em um lugar alto, isolado, onde se possam observar as estrelas. Então, fiquei me perguntando onde ficaria este observatório.Quem sabe um lugar onde eu já estivesse estado?

Em 1975 fiz uma viagem do Rio de Janeiro ao Peru, passando pela Bolívia, pelo pantatal mato-grossense, por Machu Picchu, chegando até Lima. Desta viagem recordo-me, entre outras coisas, do Monte Illimani, que fica a mais de 6.000 metros de altitude e que pode ser visto de La Paz. É uma visão muito bonita: o Illimani ao alto e a cidade de La Paz abaixo. È como se o monte a guardasse, a protegesse, imponente, com suas neves eternas. Então quem sabe não pudesse colocar, em sentido figurado, o meu observatório ali? È uma bela recordação, sem dúvida, uma bela imagem. Contudo, eu não tenho maior ligação afetiva com La Paz ou com sua montanha, afora as ótimas recordações daquela viagem. Não dava pra ser ali.

E o Wayna Picchu e a visão maravilhosa que se tem dali de Machu Picchu? O Wayna Picchu é uma montanha bem menor do que o Illimani, mas de modo semelhante parece proteger a cidade de Machu Picchu, um lugar mágico, diferente, com vibrações muito especiais. Machu Picchu fica no alto da montanha e suas construções são todas feitas em curvas de nível, em pedra, com musgo e uma espécie de grama que a envolve, em perfeita harmonia com os Andes. È uma cidade histórica, no Peru, construída pelos incas no século XV. Ainda assim, mesmo com gratas lembranças, não sou peruano, e, a despeito da beleza do Wayna Picchu, meu observatório não podia ser lá.

Como moro em Niterói, poderia chamar-se observatório Serra da Tiririca, mas ficaria meio estranho. Ou então Alto Mourão, de onde se tem uma visão linda de Itacoatiara, Itaipu, Marica e da baía de Guanabara. Todavia, não sou trilheiro e lá só estive lá umas duas vezes, há muito tempo atrás. Não deu também.
Pensei então no Morro das Contas, onde ficava o sítio de meu avô, em Amparo, Nova Friburgo e achei que ficaria bem – Observatório Espiritual Morro das Contas. Gostei. Ali no sítio chupava-se laranja no pé, andava-se a cavalo, respirava-se o ar puro da montanha, comia-se bem (arroz e feijão bem feito, comida caseira, sem luxo) e fazia-se as coisas sem presa. Ademais, o sítio de vovô é um lugar de onde tenho belas recordações.

Bem, o caminho para o Morro das Contas é o seguinte, de acordo com minha memória afetiva – hoje em dia deve outra coisa: chegando em Friburgo, pega-se a estrada para Amparo até a Parada Fully (ali perto ficava a venda do seu Didi); uns trezentos metros depois, havia uma estradinha à esquerda, de onde se descia, virava-se novamente à esquerda, depois à direita em nova subida, passando pela casa de seu Justino, que era o Delegado do lugar; seguia-se por esta estrada de terra, passava-se pelo sítio de Dr. Herbert, até o sítio do Dotô Maro (era assim que se falava o nome de vovô – Dr. Mário). Continuava-se subindo, passava-se pelo sítio do Mix, para então mais avistar-se o Morro das Contas. E, para subir-se no alto do morro, tinha que se pegar uma trilha depois do hotel, à direita, perto da casa de seu Vilson. O morro é ali
Bem o local físico do morro é este onde falei. A descrição é a de minha infância. Seu Justino já não está entre nós, meu avô também já se foi e não existe mais a venda do Didi, porém, assim se explicavam as direções naquela época - pelas propriedades, pelas pedras, pelas árvores, pelos rios. Por exemplo: depois do abacateiro o senhor vira à direita; chega no rio e segue em frente, até topar com uma pedra bonita, grande, daí o senhor vira “às dereita”; pronto, é logo ali “indiante”.

Então, foi assim que cheguei ao Morro das Contas. Na verdade, aqui em casa, o morro fica num quartinho dos fundos onde coloquei um computador. È ali meu observatório. É dali onde, ouvindo meus pensamentos, ao sentir do meu coração, observo as coisas à minha volta.