quinta-feira, 1 de abril de 2010

Ele chegou vociferando

Ele chegou vociferendo: - Como vocês ousam me trazer aqui sem a minha permissão? Que ousadia! Vocês vão ver! Iremos acabar com esta reunião!Covardes! Me pegaram na covardia, desprevenido! Vocês não sabem com quem estão se metendo!

O espírito estava furioso. Na espiritualidade era senhor de largas faixas de terra na região umbralina. Dizia-se proprietário de títulos, de patentes militares e senhor de vasto exército que com certeza iria resgatá-lo.

Os médiuns videntes puderam perceber suas formas escuras, avantajadas e animalescas. Apresentava-se envolvido por uma pele dura, espessa, e possuía músculos protuberantes. Alto, fortíssimo, sua aparência com certeza inspiraria temor sobre seus comandados. Ademais, dono de uma voz potente, grave, sonora.

Ele continuava a bradar: - E ainda me amarraram! Que petulância! Eu, uma autoridade eminente, amarrada como prisioneiro comum? Exijo respeito! Respeito! Desatem-me já! Estou mandando! Covardes! Soltem-me e irão ver do que sou capaz. Soltem-me! É uma ordem! Soldados! Soldados! Acabem com estes covardes! Soldados! Onde estão que não me ouvem? Vocês vão pagar por sua insubordinação! Soltem-me! Eu exijo!

Não era um perseguidor comum, mas sim um dos muitos líderes existentes na espiritualidade inferior, que impunha seu domínio através da força, da brutalidade, do autoritarismo e também de sua fria inteligência, que trabalhava no sentido de manter todos sob seu controle, sem contestação, e labutando para manter e aumentar seus domínios, sequioso que era pelo poder.

Em seguida, passou a ameaçar os participantes da reunião: - Vocês pensam que por me prenderem estarão livres? Estão muito enganados. Nós vamos acabar com vocês. Vocês vão ver. Acabou a sua paz de espírito. Terminou a harmonia familiar. Se não pegarmos vocês, pegaremos suas esposas, seus maridos, seus filhos. Vamos causar perturbações, desentendimentos, doenças, tudo de ruim. A vida de vocês não irá pra frente. Vai desandar tudo. Vocês vão ver, covardes!

Era uma entidade como tantas outras muito endurecida, senhora de si, sendo preciso muito tato e paciência para descobrir-se uma brecha, um espaço qualquer que conduzisse ao seu coração, de modo a perceber-se a razão de tanto ódio e ressentimento.

E ele prosseguia: - É muito melhor para vocês me largarem. Deixem-me em paz. Deixem-me ir e não sofrerão represálias. Feiticeiros. Me soltem seus feiticeiros. Qual o sortilégio que vocês usaram para me pegar? Vocês são cheios de truques. Bem que me avisaram...

Estávamos próximos do Natal e, como sabido, quando a espiritualidade superior mais se aproxima da Terra. É época de solidariedade, de muitas ações em favor daqueles que mais necessitam. De se ligar para os amigos distantes. De se refazer laços afetivos. De alegria e de manifestações de carinho por aqueles a quem queremos bem. Em virtude das melhores condições psíquicas e vibratórias do planeta, os espíritos mais evoluídos podem atuar sobre mentes enfermiças, como a que se manifestava naquele momento, abrindo espaço para a ação do bem em vastas regiões onde ainda predomina a ignorância.

Por sua vez, se a espiritualidade superior agia, tal fato também era de conhecimento das inteligências trevosas, que nesta época emitiam muitos alertas aos seus seguidores, para que tomassem cuidado com os discípulos do Cordeiro, criaturas cheias de sortilégios e ardis, que incrementavam suas ações naquela época do ano.

Ele, no entanto, muito senhor de si, não dera atenção. E isto lhe causava ainda maior contrariedade: - Bem que me avisaram... Malditos! Malditos! Covardes! Embusteiros! Me soltem! Qual o seu feitiço? Me respondam!

Na reunião predominava o clima de paz, de harmonia. Energias sutis, imperceptíveis ao nosso plano, invadiam o ambiente. Pequenos flocos de luz saturavam a sala onde estávamos. O impacto de tais vibrações afinal atingira a entidade.

- Qual o seu feitiço? Quero saber! - Tornou a perguntar.

- Caro irmão – respondeu o doutrinador, cercado por seus mentores espirituais – seja bem vindo.

- Eu não sou seu irmão. Sou senhor de vastas propriedades, chefe de poderoso exército e trazido aqui contra minha vontade. Quem lhe autorizou a me trazer? – Indagou.

- Todos nós trabalhamos aqui sob a orientação de nosso querido mestre Jesus – informou o companheiro que doutrinava.

- Jesus! Jesus! Sempre Jesus! Malditos discípulos do Cordeiro. Vocês irão me pagar.

- Mas porque tanto ódio assim de Jesus, que só pregou o amor, a paz e somente fez o bem? Não entendo a origem deste ódio – falou o doutrinador.

- Jesus me abandonou! Maldito! Quando eu mais precisava! Ouviu bem? Me abandonou. – Respondeu.

- Meu irmão, Jesus não abandona a ninguém. Você está equivocado. – Retrucou.

- Você não sabe de nada. De nada! – Protestou.

- Então me diga.

- Não quero!

- Me conte. Irá lhe fazer bem. – disse o doutrinador.

- Não. Não quero... – disse com a voz vacilante.

O doutrinador, intuído por seus guias espirituais, então lhe disse: - É necessário meu irmão. Para o seu bem, volte no tempo. Vamos voltar no tempo. Lembre-se da época em que você amava a Jesus...

- Não quero. Não quero...

Deste modo, a entidade foi recuando no tempo, até a noite em que fora queimado por ordem daqueles que perseguiam os protestantes. Via-se queimado, ardendo em chamas, clamando por Jesus. Soube-se ainda que vagara na espiritualidade, sem destino, passando a odiar tudo o que dissesse respeito ao Mestre. Ele não o abandonara? Decidira então acabar com ele.

Enfim, recuando no tempo, pode rever o seu sofrimento e sentiu-se só. E pela primeira vez pediu ajuda.

- Eu não agüento mais. Não agüento mais. Me ajudem. Me ajudem.

Sua couraça havia se despedaçado. Agora via-se como homem comum, coberto de feridas, fruto do ódio acumulado por todos aqueles anos. Após sentida prece, a entidade saiu adormecida, sendo encaminhada para tratamento.

Esta estória é comum a muitas entidades que um dia quiseram seguir Jesus. No entanto, após passar por duras provas, que também muitos de nós talvez não houvéssemos suportado, revoltaram-se contra o Mestre.

Quanto a nós, quem sabe o quanto erramos? Onde estivemos? O que fizemos? Em benefício de todos, cabe colocarmos em pratica os ensinamentos do Mestre, a fim de evitarmos criar mais problemas em nossa caminhada e através do amor fraternal nos auxiliarmos uns aos outros.

Quanto ao feitiço, aquele ao qual se referiu a entidade de quem falamos e que irá transformá-la e a todos nós, não há outro: é o amor. Aquele mesmo, como disse Jesus, que cobre a multidão dos pecados.

Muita paz.

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